Banalidades

#6 Our Pets | A primeira morte da família

Durante as nossas férias, os gatos ficaram em casa, como sempre, com visitas regulares de quem trata sempre deles, e as tartarugas foram elas próprias de férias para casa dos avós paternos. Uma delas, a mais pequena, andava adoentada há algum tempo, com uma constipação, mas tinha mostrado sinais de melhoras nos últimos dias.

A verdade é que durante a nossa ausência esteve sempre bem, embora menos activa e menos comilona do que a outra, como sempre tinha sido. Dois dias depois do nosso regresso, fomos buscá-las e trouxemo-las para casa. No dia seguinte, notámos que estava mais parada do que era hábito e que praticamente não comia, e à noite já praticamente não reagia e estava sempre parada e de olhos fechados. Na manhã de 4. feira estava morta dentro de água.
Foi preciso uma grande dose de calma para explicar o tema aos miúdos. [Eu fiquei logo de lágrimas nos olhos por ver a bichinha ali caída sem vida] Não que a morte seja um tema novo para eles, porque já  abordámos e já respondemos a perguntas difíceis muitas vezes, mas porque foi a primeira vez que a sentiram na primeira pessoa. As perguntas agora eram outras e a curiosidade também. 
Pediram para pegar nela com a mão, observaram atentamente, fizeram festinhas e disseram várias vezes coisas como: “coitadinha dela…”. Fizeram perguntas. Para onde é que ela ia agora. Quando é que ia acordar. Explicámos que não acordava. Que morrer é dormir para sempre. Como já estão familiarizados com o detalhe de que quando se morre vai-se para o céu, dissemos que ela agora ia também para o céu, para junto da Doly, a gata dos avós que morreu há uns meses atrás. Escolheram uma caixinha de cartão no meio das coisas que têm no quarto dos brinquedos e colocámos a tartaruga lá dentro. Quando saímos, fomos até junto de uma zona de terra ao pé de casa, abrimos um buraco, e enterrámos a tartaruga. O Daniel, dono desta tartaruga, pediu para ser ele a coloca-la no buraquinho e quis deitar a terra com a pá para a tapar. 
Saímos, e passámos esse dia na praia. A meio da tarde, quando o Daniel estava mais parado, perguntei-lhe o que tinha. Respondeu-me que estava triste porque a tartaruga dele tinha morrido, e perguntou se eu achava que ela já tinha ido para o céu. Respondi que sim, que de certeza que tinha ido! Em resposta pediu-me para quando chegássemos a casa irmos abrir o buraquinho para ver se ela ainda lá estava. Expliquei que não podíamos abrir o buraquinho, não sei bem como mas lá aceitou e não voltou a falar no assunto.
Não se ainda vai haver mais conversa acerca da tartaruga, mas esta foi sem dúvida a primeira vez que tiveram contacto com uma morte directamente. Viram a morte e geriram-na. Não somos apologistas de que se deva sujeitar as crianças a traumas com o tema, mas a verdade é que com 4 anos já têm o entendimento necessário para começar a saber que a morte existe e para à sua maneira, começar a tentar percebê-la. Se é que isso é possível. 
A mim, custa-me ir dar comida apenas a uma tartaruga todas as manhãs. Custa-me vê-la ali sozinha num canto do aquário, sem a outra pendurada na carapaça a espreitar ao cimo da vida. É assim a vida, e sim é cruel!

2 Comments

  • Ana Marques

    Que medo que tenho quando chegar a altura das perguntas difíceis. Tenho medo de entrar por caminhos onde depois fica tudo mais dificil. E tenho medo que a explicação que nós acharmos melhor, mais tardr venha a ser desmentida por colegas e professores nas escolinhas. Lembro me que aconteceu com os meus irmaos e era muito chato o "a professora disse que nao era assim"

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