Deixem as crianças serem crianças!
Nos dias que correm, é cada vez mais frequente ouvirmos pais que têm filhos em idade do ensino básico, a queixarem-se da quantidade de trabalhos da escola que os filhos levam diariamente para casa. Os miúdos saem da escola, na sua maioria tarde, porque os horários são cada vez mais prolongados no dia, chegam a casa cansados, e em vez de tentarem descomprimir e brincar, têm que tomar banho, jantar e fazer trabalhos da escola, tudo em velocidade aceleradíssima, sob pena de irem tarde para a cama e não descansarem o suficiente para no dia seguinte irem frescos para a escola.
Vivemos num mundo em que os valores estão subvertidos. Ainda não percebi se são os decisores que tomam decisões idiotas, se são os professores que não gostam do que fazem e não têm paciência para ensinar, descartando o cumprimento do programa com milhares de exercícios feitos em casa e não na escola, se é um pouco das duas coisas. Percebi sim, que quando os meus filhos entrarem para a escola, vou ser daquelas mães muito chatas que vai andar sempre “em cima” da professora ou professor, para evitar que se criem constrangimentos na aprendizagem dos meus filhos. Todos queremos que os nossos filhos sejam bons alunos, que tenham bom aproveitamento escolar, mas alguém pensou que para isso eles também precisam de folga? Precisam de desanuviar, de brincar, de saltar, de fazer tudo menos estudar… precisam de ser crianças! Porque não se enganem! É isso que eles são! E precisam de tempo para o ser!
Na nossa época, saímos da escola ás 15h30. Com um dia de escola despachado, tínhamos tempo para ir a casa lanchar, e ir brincar para rua. Saltávamos ao elástico, jogávamos à macaca, íamos jogar às escondidas para o Olival! Passávamos a tarde nisto! Se chovesse, podíamos ir para a casinha do quinta da avó Celeste brincar com um jogo qualquer, ou para a casa da Avó Jacinta, a avó do Rodrigo, jogar Spectrum! Desanuviávamos, descansávamos, espairecíamos! E hoje? Muito mais do que simplesmente pela questão da segurança em andar a brincar na rua com os amigos como antigamente, onde é que os miúdos de hoje se podem dar ao luxo de brincar?
Encontrei há dias um artigo muito interessante, sobre a necessidade de brincar. Achei que o devia partilhar. Porque ainda acredito que há professores e professoras que têm esta consciência, e que eventualmente um dia isto terá importância para o sistema de ensino Nacional.
“É através do brincar que as crianças desenvolvem parte das suas aprendizagens em inúmeros domínios, como o cognitivo, físico e sócio-emocional. Brincar é sem dúvida, sinónimo de crescer, uma vez que é um momento privilegiado onde a criança aprende a conhecer o mundo, explorando aquilo que a rodeia. Ao brincar a criança é convidada a recorrer aquilo que já adquiriu através da observação do mundo exterior, aquilo que já aprendeu, e passa a desenvolver a sua capacidade de imitação, invenção, construção, passando a expressar-se de diferentes formas e moldando o seu comportamento em função daquilo que quer transmitir. É através do brincar que a criança desenvolve a sua comunicação verbal e não-verbal.
Não se pode descurar a real importância que o brincar assume no desenvolvimento das crianças e na própria relação entre pais e filhos. É essencial que os pais orientem parte das brincadeiras dos seus filhos, para que possam ensiná-los a brincar, para adequarem algumas dessas brincadeiras à sua idade, para corrigir alguns dos comportamentos das crianças e para proporcionarem igualmente autonomia aos mais pequenos.
Nos dias de hoje é cada vez menos comum ver-se pais e filhos a brincar ao ar livre, passando as crianças a estarem mais tempo dentro de casa, recorrendo assim com maior facilidade às novas tecnologias. Apesar de existirem jogos tecnológicos igualmente interessantes e estimulantes dos quais as crianças gostam, sabe-se que existe um conjunto de aprendizagem que não são adquiridas através dos mesmos. Para além disso, esse conjunto de jogos, são habitualmente mais solitários, e a interacção entre a família pouco existe, ficando a comunicação mais reduzida. Contudo, para diminuir o acesso fugaz às tecnologias e por forma a travar parte das brincadeiras solitárias, é necessário criar-se alternativas para as crianças.
E uma vez que falamos da importância do brincar, com a chegada da Primavera, é tempo de brincar ao ar livre. É tempo de pegar nos brinquedos, coloca-los dentro do saco e levá-los para o jardim mais próximo de casa para que histórias mágicas sejam criadas com eles. É tempo de encostar o telecomando da televisão, dos videojogos, e ir para a rua correr, saltar, dar chutos na bola, saltar à corda e jogar raquetes. É tempo de pegar na bicicleta, nos patins ou na trotinete e deixar que as crianças exercitem, que sejam agitadas e que gritem e se mexam à sua vontade.
Para além de tudo isto, existem um conjunto de actividades e de brincadeiras que do ponto de vista desenvolvimental são muito estimulantes, simples de concretizar em família, e que facilmente podem ser realizadas ao ar livre. Podemos brincar com os nossos filhos ao faz-de-conta no parque, podemos levar os fantoches para um piquenique em família, podemos realizar mímica, fazer jogos como os puzzles ou o mikado e outros semelhantes numa mesa de jardim. Levem as aguarelas, os lápis de cor e os marcadores para fora de casa e façam desenhos e pintem em família aquilo que cada um observa. E uma caça ao tesouro? Há quanto tempo não fazem uma caça ao tesouro em família?
Se brincar é sinónimo de crescer, então brinquem muito, e especialmente façam-no sempre que possível ao ar livre, para que as crianças tenham um desenvolvimento saudável.
Texto escrito para a B de Brincar por:
Cecília Santos
Psicóloga Clínica”
Será assim tão difícil percebermos de uma vez por todas o que realmente importa! Se a base da nossa estrutura falhar, o que lhe construímos em cima só pode cair. Parece que há muito quem se esqueça disso.
2 Comments
Unknown
Eu sou daquelas mães que se acho que os TPC's são demais ou se já é muito tarde, eles pura e simplesmente não os fazem e levam um recadinho ao professor a dizer que a mãe não autorizou os TPC's. Claro que precisam de brincar. São crianças e o ritmo já é tão acelerado que parecem mini adulto. E eu até vivo numa cidade do litoral. Nem quero imaginar quem vive em Lisboa…
anaraquel
Ontem, na reunião de pais na creche da minha filha, a educadora referiu que a festa de final de ano seria em junho, com direito a piquenique no parque. e acrescentou a olhar para mim: "na segunda casa da Rita". porque faço questão de a levar ao parque ou dar um pequeno passeio todos os dias a seguir à escola. para mim é importante vê-la a sujar-se na piscina das pedrinhas ou a olhar espantada para as formigas. enquanto puder, esta será a rotina.
tenho esperança que esta moda de sobrecarregar de forma horrenda os miúdos de tpc's acabe até a Rita entrar para a escola… veremos…