Os meus 35 anos
David Ferreira Caldeira, eu! Nasci a 19 de Abril de 1979, filho de Isabel e António Caldeira, na cidade de Setúbal.
3 anos depois, a 9 de Janeiro, nasce o meu irmão Daniel. Infância muito feliz, com uma mãe sempre presente e um pai que se “matou a trabalhar” para que a família nunca tivesse de passar pelas privações que para sempre o marcaram.
Tanto eu como o meu irmão desde os 4 anos que praticámos desporto. Nas palavras dos meus pais, é sempre melhor investir dinheiro em equipamento desportivo, do que em desintoxicações. E parece que resultou, pois o contacto com essas realidades apesar de ter sido frequente durante a nossa vida, nunca foi algo que despertasse a curiosidade, era bem melhor passar os fins de semana por esse país fora, numa carrinha de nove lugares cheia de putos e de bicicletas, a percorrer o nosso Portugal de lés a lés.
Apesar da bicicleta se ter tornado no desporto de eleição, que dura até aos dias de hoje, fiz de tudo um pouco: atletismo, trampolins, canoagem, remo, natação, taekwondo, aikido, capoeira, mergulho, um sem número de desportos. No fim o que ficou foi mesmo a bicicleta. Desporto que me deu muitos amigos, que me trouxe das maiores alegrias e a minha maior tristeza. Levou-me o meu irmão, num trágico acidente, num estúpido acidente, quando treinava com os seus colegas de equipa. Não acredito no destino, não acredito em entidades superiores, mas acredito que nesse dia, estavam reunidas uma série de circunstâncias, em que era impossível fugir ao inevitavelmente, que aconteceu!
Um dia quando chegar o meu dia, pelo menos levo comigo boas recordações, lindas recordações de uma infância a 2 cheia de amor e carinho, entre 2 irmãos e a 4 com dois maravilhosos pais. Nunca tivémos as mais recentes evoluções tecnológicas, mas muito mais importante, tivemos o amor incondicional de dois pais, que tudo fizeram para que nada nos faltasse.
Voltando à história da minha vida, fiz a primária, o ciclo e o liceu na minha cidade de Setúbal, nesta altura o btt tinha dado lugar ao ciclismo de estrada e o amadorismo puro tinha dado lugar a um semi-profissionalismo, onde todos os tempos livres da escola eram preenchidos com treinos ou descanso e recuperação.
Com o final do secundário, vieram as decisões, no final optei, com o consentimento dos pais em ficar perto de casa, numa faculdade privada em vez de ir para longe estudar numa estatal. O IADE foi a minha escolha. Era considerada a melhor faculdade de design do país, mas o factor financeiro era um problema, problema esse resolvido com a candidatura e atribuição de uma bolsa de estudo estatal, que me pagava a faculdade e os transportes, a única condição era o bom aproveitamento escolar. Posso dizer que nunca reprovei um ano escolar em toda a minha vida, nunca fui um aluno de notas excepcionais, digamos que fazia o necessário para passar sem notas negativas. No final terminei com média de 14 valores. Utopicamente acreditava que era possível conciliar a minha vida escolar com a desportiva, no fim do segundo ano da faculdade tive de mais uma vez tomar uma decisão que iria modificar a minha vida: escola ou bicicleta. Por esta altura corria no clube de ciclismo de Tavira, onde durante a época desportiva tínhamos diversas provas em conjunto com as equipas profissionais do pelotão de ciclismo, e era necessária uma dedicação a 100% não havia espaço para meios termos.
A decisão acabou por pender para a faculdade, depois de tanto investimento pessoal e monetário, por parte dos meus pais, não poderia deixar de concluir o ensino superior.
Com o fim da faculdade veio a dura realidade do mercado de trabalho, e eu à semelhança de 90% dia estudantes recém licenciados, não estava preparado para o que me esperava. Quando saímos da faculdade vimos com a formatação de que se tirarmos um curso superior seremos recompensados, profissional e monetariamente, desde o dia 1, not!
Seguiu-se um ano em que não encontrei trabalho na minha área e enquanto ia enviando curriculums, ia trabalhando com os meus tios na pintura de construção civil, sim porque trabalho é trabalho, desde que seja honesto, o mesmo não se pode dizer dessa classe elitista portuguesa, mas isso são outras histórias.
Fui saltando de empresa em empresa sem nunca me sentir profissionalmente concretizado, quando achava que já não tinha nada mais a aprender, seguia em frente.
Foi por esta altura, quando me deslocava para um trabalho de exterior que recebi um telefonema do meu pai, de que nunca mais me vou esquecer. O meu pai ligou-me a chorar, eu sem conseguir perceber o que ele me estava a querer dizer, até que consegui perceber!!! O teu irmão morreu! Gelei, bloqueie, não raciocinei. Hoje consigo perceber que quando passamos por um evento traumático, levamos dias ou mesmo semanas até que se faça luz! Quando isso acontece, digamos que não é nada bom! Os meus pais ficaram em choque, como qualquer pai. A lei da natureza diz que primeiro vão os pais e só depois, muito mais tarde, partem os filhos. Quando essa regra é quebrada, nada de bom advém daí. Marca para a vida toda, nunca mais se esquece, sobrevive-se mas não se esquece! O importante é termos ao que nos agarrarmos para seguirmos em frente, seja lá o que isso for ou quem for!
No meu caso tive de sair de casa, não conseguia continuar a dormir no mesmo quarto em que tinha partilhado tantos momentos com o meu irmão. Bem sei que os meus pais não gostaram da ideia, mas como sempre,respeitaram a minha decisão, e eu estou-lhes grato. Não fui para longe. Só para o outro lado da rua, mas foi a minha maneira de lidar com a dor e o sentimento de perda e injustiça desta vida.
Uns dias melhor outros dias pior, mas a vida seguiu o seu rumo. Os meus pais viviam um dia de cada vez e eu ia saltando de relação em relação, compromissos sérios não eram para mim! Mais uma vez os pais não gostavam, mas tentavam respeitar o meu espaço (nem sempre mas enfim, mãe é mãe!). Não foram os melhores anos da minha vida, há coisas que gostava de não ter feito, outras que queria fazer e não me deixaram, mas como costumo dizer, se o meu passado me trouxe onde estou hoje, não posso ter arrependimentos.
Tenho a minha empresa de design gráfico a DCBYDC, continuo a dar umas aulas de Indoor Cycle, sim porque lá pelo meio ainda me formei em instrutor de aulas de grupo e em conjunto com o design fui dando aulas em diversos clubes, hoje já sou dou 3 aulas por semana, para me ir mantendo activo.
E tenho uma família maravilhosa, a minha esposa a Sara, que tanto me tem apoiado ao longo destes 6 anos, sempre a remar contra a maré, mas lá vamos conseguindo.
De há 2 anos para cá, a nossa família duplicou e o Daniel e a Carolina vieram alegrar os nossos dias, não há nada melhor que chegar a casa, depois de um dia exaustivo e ser recebido por duas miniaturas de braços abertos a gritar papá!!! Não há dinheiro que pague estes nossos momentos.
Com a gravidez, a Sara decidiu começar a escrever um blog, para ir registando o crescimento dos nossos filhos, inicialmente privado, só para os amigos mais próximos e posteriormente aberto ao público, confesso que tive alguma renitência mas ainda bem que o fez, este blog tem-nos trazido boas amizades, daquelas verdadeiras e por isso estou-lhe grato, porque uma vida sem amigos com os quais partilhar os bons e também os mais momentos, não é a mesma.
Por isso nada de arrependimentos, temos de viver um dia de cada vez, nada de dar passos maiores que as pernas, viver para ver os meus filhos possam crescer saudáveis e alegres, se puder ser um bocado mais desafogado de despesas e com a conta um pouco mais recheada tanto melhor.
One Comment
Lénia Rufino
Muitos parabéns, David!! Conhecemo-nos há pouco tempo mas gosto muito de vocês e espero que tenhamos muitos anos para fazer crescer esta amizade!! Beijo!