Banalidades

Problemas de integração e hábitos culturais

Hoje é segunda feira. Por excelência, o dia em que custa mais deixá-los na creche. Custa-nos a nós, a quem regra geral não apetece ter que ir trabalhar, e custa-lhes a eles, a quem a paródia do fim de semana está bem viva na memória.

Hoje o Daniel disse logo que acordou que não queria ir para a escola. “Quero ir passear contigo mamã!” – dizia com um ar triste. Lá lhe expliquei pela milionésima vez que para podermos passear aos fins de semana e por vezes aos fins de dia, temos que trabalhar. Disse que sim, e apesar de ainda ter feito mais umas tentativas de argumentação sobre o não querer ir à escola, no momento de ficar até acabou por ficar mais ou menos bem [leia-se sem lágrimas!].

Hoje quando entrámos na sala, havia dois colegas novos. Um, que já era da sala mas tinha estado de férias, e outro que veio de novo. Sobre o 1.º, era novidade para a Carolina e para o Daniel, mas claro que conhecia os restantes meninos da sala e estava perfeitamente integrado. Tem 5 anos e é surdo-mudo. A surdez não é total, usa aparelho auditivo mas ouve muito pouco. E não fala. Nada. A comunicação é feita por gestos, pois o menino não sabe linguagem gestual. Para os adultos é mais difícil do que para as crianças, mas ainda assim, o menino está perfeitamente integrado no grupo.
O segundo menino, foi hoje pela primeira vez à creche. É chinês, tem 4 anos, e não diz uma palavra de Português. A mãe diz “bom dia” e pouco mais. Foi levá-lo, entregou-o à educadora, disse adeus e foi-se embora. Quando nós entrámos na sala, o menino estava em pé, junto da educadora e da auxiliar, com um ar perdido, a olhar em volta. Ainda assim, não só não havia lágrimas como nem sequer havia sinal de terem estado prestes a sair. A expressão era mais de curiosidade. Pareceu-me que estava a observar cada detalhe, cada pormenor, das pessoas e do espaço que o rodeava. 
Os meus filhos falam Português correcto, fazem-se entender na perfeição, andam numa escola a 2 minutos de casa e num ambiente que lhes é perfeitamente familiar em termos de hábitos e rotinas, e mesmo assim, há dias em que ficam com resistência, com lágrimas, com pouca vontade. Este menino não fala a língua dos outros meninos [ou dos adultos com quem passa o dia], não conhece o espaço, a cultura, o país, os hábitos, as rotinas, mas estava ali, em pé no meio de uma sala cheia, [aparentemente] tranquilo e sem dramas. 
Será só porque é novidade, ou a integração das crianças em ambientes diferentes também terá contornos culturais? Seremos nós umas mães galinhas, que choramos quando os miúdos vão para a escola e ficamos o dia inteiro em sofrimento? Seremos nós as responsáveis por passar esse sentimento aos nossos filhos e de os deixar ansiosos com as idas para a escola? O que vos parece?

2 Comments

  • semprechique

    Olá Sara
    Descobri muito recentemente que tens um blog e de quando em vez, venho cá meter o nariz.
    Só quero fazer um reparo, que também aprendi a semana passada: já não se diz surdo-mudo. Diz-se só surdo. Estas crianças não falam porque não ouvem.
    Isto foi-me explicado por uma professora do Ensino Especial.
    Felicidades

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