# Vidas | E se fosses tu a mãe de uma criança com Asperger?
Perto de nossa casa cruzamo-nos regularmente com um senhor que julgo estar na casa dos 40 anos e que não sei exactamente o que tem, mas é diferente. Anda muitas vezes a passear pela rua sozinho, interpela quem passa e é quase sempre ignorado ou olhado com desprezo. Esta semana, um dia de manhã, ao cruzar-se connosco olhou para mim, virou-se para o meu marido e disse: “Olha! Gosto de mulheres assim! Bonitas!”. A reacção foi imediata! Demos uma gargalhada, os três porque ele próprio achou piada ao que disse, e o meu marido respondeu-lhe “Também eu!”. Ele seguiu a sua vida satisfeito e nós também. Não custou nada sermos bem educados e para ele tenho a certeza que ter uma resposta normal fez a diferença!
Não conheço pessoalmente a Mónica, mas ela partilhou a sua história comigo e desafiei-a a partilhá-lha também convosco. A Mónica é mãe de um menino com Asperger, e já viveu situações complicadas por isso. Pediu-me ajuda para sensibilizar quem me lê para o tema e eu fiz-lhe uma pequena entrevista para que partlhasse connosco o que significa ser mãe de um menino com esta doença. A mudança de mentalidades urge e todos nós temos um papel a desempenhar!
“Nasci em Guimarães a 10 de Fevereiro de 1990, numa família muito humilde como uma educação muito rigorosa que me tornou uma mulher muito determinada e lutadora. Não admito que me digam que “não consigo” nem de pessoas que desistem das coisas ao primeira queda. Mas ao mesmo tempo sou uma menina sonhadora, vaidosa, delicada, com um coração muito mole e apaixonada pela vida.
Gosto de cozinhar, escrever, de números, de pessoas, de comunicar mas acima de tudo gosto muito de ser Mãe. E não tenho dúvidas que dou o meu melhor para desempenhar esse meu papel da melhor maneira para criar três grandes “seres humanos”!
1.Que idade tem o Martim?
O Martim neste momento está com 5 anos e nove meses.
2. É o mais novo dos três irmãos?
Sim Martim é o mais novo.
3. Quando é que descobriu que o Martim tinha Asperger?
Descobrimos um ano depois de muita discórdia entre os médicos sobre o diagnóstico.
4. Quais foram os sintomas que despertaram o alerta?
O Martim infelizmente nunca foi uma criança “dita normal”, era um bebe que não dormia (nem de dia nem de noite), tinha um nível de desenvolvimento muito diferente das outras crianças, a socialização do Martim era nula e era uma criança muito agitada.
5. Que idade tinha o Martim quando descobriram?
Infelizmente os sintomas sempre estiveram lá mas só com 4 anos é que o Asperger foi posto em cima da mesa.
6. Como foi a reacção das pessoas próximas?
A reacção das pessoas foi complicada, estas crianças são vistas como malucas e mal educadas. a sociedade ainda não as consegue aceitar. Mas a reacção mais complicada foi mesmo a da família, que não estava preparada para a chegada de uma “criança especial”. Ainda hoje passados cinco anos muita gente se afasta devido ao problema dele.
7. O que é mudou na vossa vida enquanto família desde esse dia?
Mudou tudo, houve familiares que se afastaram e nos meteram de lado mas em compensação a relação de casal abanou mas tornou se mais forte. Foi algo que nos uniu ainda mais.
8. Acha possível afirmar que o Martim pode vir a ter uma vida perfeitamente independente apesar de sofrer de Asperger?
Quero acreditar que sim e temos feito por isso mas com a fraca verbalização do Martim isso torna-se complicado. Hoje em dia já come e veste-se sozinho apesar das muitas dificuldades que tem. É uma criança independente mas com as suas limitações. Mas com muito trabalho ele vai conseguir.
9. Qual foi a situação mais complicada que já teve que gerir com a doença do Martim?
A situação mais complicada que tive de gerir foi o ter mais duas filhas, pois uma criança autista requer muita atenção e disponibilidade,e todos os dias é um desafio.
10. Disse-me que na escola houve situações complicadas. Foi mais difícil geri-las com o próprio Martim ou com os outros?
Sim o Martim andou num infantário onde os meninos o tratavam mal e lhe chamavam de “o mau”. Era posto de parte. E até eu nas reuniões de pais era olhada de lado. Foi uma situação muito complicada e tivemos de bater o pé e o tirar dali.
11. Considera que o Martim se sente revoltado por ter consciência de que tem um problema?
Sim sem dúvida,o Martim é muito revoltado principalmente pelas pessoas não o entenderem, a falta de comunicação revolta-o.
12. Como é ser mãe de 3 crianças e lidar com uma patologia destas?
Ser mãe é maravilhoso e ser mãe de três onde um deles é”especial” é a prova de fogo. Não é fácil mas com muita vontade, organização e amor tudo se consegue.
13. O que diria a uma mãe que acabou de descobrir que tem um filho com Asperger?
Antes de mais que não está sozinha e que o mundo não acabou, que somos muitas e que estamos aqui para nós ajudar. Que vá pela sua intuição de “Mãe” e não pela cabeça dos outros. Que não desespere e que se mantenha calma, pois a sua agitação apenas vai agitar o seu filho. Caso se sinta cansada que peça ajuda, ninguém é de pedra. E acima de tudo que não desista,o caminho não vai ser fácil mas todo o caminho a percorrer e os resultados vão valer a pena.”
Este foi um post que me custou escrever, não por abordar um tema difícil, mas por espelhar o quanto as pessoas conseguem ser más. À Mónica, ao Martim, ao pai e às manas deixo um grande beijinho pela coragem e perseverança! Podem deixar uma palavra de incentivo à Mónica por aqui, ou no blog que ela criou para partilhar a sua experiência que podem ler aqui.
4 Comments
Sofia
Acompanho o blog da Mónica e aconselho a tuas as mães e pais!!!!
Parabéns pela dedicação e ajuda! Beijinhos
felicidade-35
Acompanho o blog Mãe por um fio e adoro, encontra-se tão pouco sobre o Asperger em português e aqui encontrei alguém que entende o que sinto e fala de uma forma que me faz sentir que não estou só, obrigada Mónica!
Gloria Vieira
Olá Mónica! Descobri-a ontem…aqui… Por acaso! Já li vários dos seus posts e rola sempre uma lágrima. Obrigada por criar um blog sobre este tema que entrou à uns meses na minha vida e do qual ainda estou a recuperar… Agora é seguir em frente com força,determinação e muito amor!! As barreiras são muitas mas havemos de vence-las…!OBRIGADA ❤
.
Só queria acrescentar que o autismo não é uma doença…